quarta-feira, 27 de abril de 2022

O mesmo sentimento que houve em Cristo

Na cerimônia conhecida como "lava pés", Jesus faz um serviço
que era atribuído ao escravo menos importante de uma casa.


De sorte que haja em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus, q
ue, sendo em forma de Deus, não teve por usurpação ser igual a Deus, mas esvaziou-se a si mesmo, tomando a forma de servo, fazendo-se semelhante aos homens; e, achado na forma de homem, humilhou-se a si mesmo, sendo obediente até à morte, e morte de cruz. (Filipenses 2:5-8)

É impressionante o mandamento que Deus nos dá em Filipenses 2:5, ao nos orientar que devemos ter "o mesmo sentimento que houve em Jesus Cristo". Mesmo sendo Filho, Cristo se faz um servo, a fim de nos salvar por meio do Seu sacrifício na cruz.

Sendo dono de tudo, se torna como uma de Suas criaturas e passa por todo o sofrimento de estar neste mundo caído, sendo criticado, resistido, perseguido, traído, cuspido, torturado, humilhado e morto, de forma maligna e covarde. Mas tudo isso Ele passou para que eu e você pudéssemos ter o que Ele tinha por natureza: a filiação divina.

Contudo, ter este mesmo sentimento, que movia Jesus, não é algo que simplesmente surge automaticamente em nossos corações. É algo que precisa ser desenvolvido! De fato, tendo em vista que somos novas criaturas, nós já temos a natureza divina em espírito, apesar disso, precisaremos desenvolver esta natureza em nossas almas.


A vida de um escravo

Sendo filho, Jesus toma a "forma de servo", a fim de assumir a culpa do homem. Mas, o que, realmente, significa ser um "servo"? 

Bem, a palavra aqui traduzida como "servo" é a conhecida palavra grega δοῦλος (dulos), que significa escravo. Ora, no mundo de hoje, em especial aqui no Brasil, nós não sabemos como é a vida de um escravo, pois a escravidão já foi banida da sociedade atual, sendo considerado um crime manter alguém na condição de escravo. Nossos antepassados, contudo, sabiam muito bem como era a vida de um escravo.

A escravidão fez parte da história humana durante muito tempo, por causa do pecado que entrou no mundo. Ao longo da história, nações vencidas em guerras eram escravizadas e, gradativamente, a escravidão tornou-se a principal forma de se obter trabalhadores para os serviços em geral, principalmente aquelas tarefas mais duras.

Além da palavra δοῦλος (dulos) – escravo, existem outras palavras derivadas que são muito usadas nas Escrituras em grego:

  • δουλεία (duléia) - escravidão
  • δουλεύω (duleúo) - servir (como um escravo)

Estas palavras são bastante comuns nos textos do Novo Testamento e da Septuaginta (Velho Testamento grego). Vejamos algumas passagens:

Ninguém pode servir [δουλεύω-duleúo] a dois senhores; porque ou há de odiar um e amar o outro, ou se dedicará a um e desprezará o outro. Não podeis servir [δουλεύω-duleúo] a Deus e a Mamom. (Mateus 6:24)

Não é esta a palavra que te falamos no Egito, dizendo: Deixa-nos, que sirvamos [δουλεύω-duleúo] aos egípcios? Pois que melhor nos fora servir [δουλεύω-duleúo] aos egípcios, do que morrermos no deserto. (Êxodo 14:12)

O que se entende por alegoria; porque estas são as duas alianças; uma, do monte Sinai, gerando filhos para a servidão [δουλεία-duléia], que é Agar. (Gálatas 4:24)

Pois bem, acredito que as características da vida de um escravo mudaram ao longo das eras, mas como o livro de Filipenses foi escrito no auge do Império Romano, vamos focar na forma como acontecia a escravidão naquele período.

A vida de um escravo não era nada fácil, pois eles tinham muitos deveres, mas poucos direitos, se é que tinham algum. Vejamos algumas características: 

  • O escravo era considerado propriedade do seu senhor. Portanto, fazia parte de seus bens, não era alguém que tivesse vontade própria.
  • Não havia direito à aposentadoria, o escravo trabalhava, literalmente, até morrer. Por causa disso, a vida de um escravo era curta, devido ao muito trabalho e pouco descanso.
  • Os escravos atuavam em praticamente todas as áreas da sociedade romana, sendo que os mais valorizados eram os gladiadores. O local mais difícil para trabalhar como escravo eram as minas romanas. Mas os escravos que trabalhavam nas plantações também tinham um trabalho muito duro.
  • As mulheres escravas geralmente trabalhavam nas tarefas domésticas, mas havia algumas mais habilidosas que trabalhavam como maquiadoras e cabeleireiras. Havia também as que trabalhavam em pequenas fábricas, fazendo artesanato e joias.
  • As crianças eram o tipo de escravo mais valorizado, tendo em vista que tinham toda uma vida pela frente, para trabalharem para seus senhores.
  • Qualquer desobediência de um escravo poderia lhe render graves surras. Se um escravo matasse o seu senhor, normalmente todos os escravos da casa morreriam como punição.
  • Existiam bons senhores, que tratavam seus escravos com mais dignidade, mas o contrário também era comum. Se o escravo tivesse a sorte de ter um bom senhor, este poderia até mesmo libertar esse escravo no futuro, algo que, de fato, acontecia.
  • Na cidade de Pompeia, por exemplo, uma casa possuía, em média, cerca de 7 escravos. Chegou a um ponto em que, no Império Romano, 1 em cada 5 habitantes era escravo. Li, certa vez, em um livro de grego, que na cidade de Atenas (na Grécia antiga),  houve um momento em que,  para cada cidadão livre, havia 2 escravos.
  • Nesse período, possuir escravos era algo tão comum como  ter empregados, nos dias de hoje. Portanto, não era algo considerado "injusto" pela sociedade da época. Quanto mais escravos alguém possuía, mais status tinha na sociedade.
Quando lemos acerca da vida de um escravo, chegamos ao entendimento de que se resumia a uma palavra: trabalho! A vida de um escravo tinha apenas o propósito de trabalhar. Ninguém comprava um escravo e o mantinha para que este pudesse se divertir ou ficar ocioso, mas para que o escravo rendesse ao seu senhor bastante trabalho.

Assim, é importante compreendermos que Jesus se tornou um servo, ou seja, um escravo, a fim de trabalhar para cumprir a obra do Pai. Podemos resumir esta obra da seguinte forma: Cristo se torna um homem, vive uma vida humana normal, depois começa a evangelizar e preparar a igreja inicial, Ele se oferece em sacrifício pelos nossos pecados e ressuscita, a fim de nos justificar. 

Após isso, Jesus se assenta à direita do trono da majestade nas alturas e vive para interceder, ou seja, Jesus não está ocioso no trono, Ele continua trabalhando por nós.
Bem como o Filho do homem não veio para ser servido, mas para servir, e para dar a sua vida em resgate de muitos. (Mateus 20:28)
Desta vez, a palavra original grega usada no verso acima não é a duleo, anteriormente estudada, mas 
uma outra palavra bem conhecida que é:
  • διακονέω (diakoneo) - servir, originada da palavra diaconia (serviço). De onde tiramos a tão conhecida palavra "diácono", que são aqueles que servem na igreja nos serviços gerais.
É muito interessante observar que o propósito da vida do próprio Cristo era servir! Jesus serviu a Deus Pai servindo aos homens, ensinando-os e oferecendo-se a Si mesmo como um sacrifício. Este foi, certamente, o trabalho mais importante que já foi atribuído alguém. Somos extremamente gratos a Jesus por ter nos servido daquela maneira, morrendo em nosso lugar.

Agora, nós, que somos salvos por Cristo, devemos também dar as nossas vidas em oferta a Deus Pai, para servi-lo da mesma maneira que Jesus fez. Nossas vidas foram vivificadas por Deus, para que pudéssemos ser instrumentos dele para vivificar outros, que hoje estão mortos em seus pecados.
Vós sois a luz do mundo; não se pode esconder uma cidade edificada sobre um monte;
Nem se acende a candeia e se coloca debaixo do alqueire, mas no velador, e dá luz a todos que estão na casa. (Mateus 5:14,15)
Sabemos que a Palavra de Deus é uma luz imensa, contudo, neste mundo, esta luz precisa brilhar através das nossas vidas, para que as pessoas vejam as nossas obras justas e possam se arrepender de seus pecados, vindo até Cristo, para serem salvas.

Em uma sociedade onde todos buscam os seus direitos, mas não se preocupam muito com os seus deveres, a palavra dita pelo apóstolo Paulo vai na contramão dessa mentalidade egoísta, mostrando qual deve ser a nossa expectativa e sentimento enquanto estamos aqui neste mundo:

Mas de nada faço questão, nem tenho a minha vida por preciosa, contanto que cumpra com alegria a minha carreira, e o ministério que recebi do Senhor Jesus, para dar testemunho do evangelho da graça de Deus. (Atos 20:24)

Este é o verdadeiro sentimento de um servo! O apóstolo sabia muito bem o que lhe esperava adiante, quando fosse para Jerusalém, mas, categoricamente, afirma que não fazia questão de nada. Como isso é diferente da mentalidade atual!

Vivemos hoje no império do "eu", onde tudo o que importa é a mim mesmo, minha imagem, meus bens, minha família etc. "Porque todos buscam o que é seu, e não o que é de Cristo Jesus." (Filipenses 2:21). Mas vamos, agora, aprender que, no Reino de Deus, as prioridades são diferentes.


A ordem correta no reino de Deus

As leis que regem o reino de Deus existem antes mesmo dos reinos dos homens, são leis eternas, imutáveis. Assim, para um cidadão do Reino de Deus, é necessário que ele aprenda como funcionam essas leis. Algo muito importante que Jesus ensinou foi sobre como funciona a questão da autoridade dentro do Reino de Deus.

O caminho para que você suba no Reino é praticamente o inverso do que ocorre no mundo. Aquele que quer ser o maior no reino dos céus deve ser o menor aqui na terra e servo de todos (Marcos 10:44).

É importante esclarecer, contudo, que não servimos às pessoas de uma forma aleatória, mas sim orientada e determinada pelo Senhor Jesus. Alguém pode achar que ser servo de todos é sempre atender aos desejos das pessoas, o que não é verdade. Jesus não obedecia às pessoas embora estivesse aqui para servir.

Sim, nós servimos as pessoas, mas tudo conforme a vontade de Deus. Cada um de nós deve atender ao seu chamado, chamado este que está ligado à Grande Comissão deixada por Cristo. Como servos, precisamos atender ao chamado de Deus para servir aos homens, mas tudo de acordo com a vontade d'Ele.

O serviço para o qual somos chamados não é para nossa própria glória e exaltação, mas para a salvação dos homens e para glória e louvor de Deus. É importante entendermos que, mesmo quando servirmos bem ao Senhor, isso não nos dá garantia alguma que as pessoas vão nos dar tapinhas nas costas e nos elogiar. Pelo contrário, pois a Palavra de Deus nos adverte que os que vivem piedosamente sofrem perseguição (2 Timóteo 3:12), mas que você deve servir procurando agradar unicamente aquele que lhe chamou.

Um dos principais motivos pelos quais o apóstolo Paulo se sentia livre, mesmo estando preso, era que ele não tinha expectativa das pessoas, mas tinha consciência de que era um escravo de Jesus Cristo e procurava agradar unicamente ao seu Senhor.


Nossa recompensa vem do nosso Senhor

Como mostrado anteriormente, os escravos que tinham bons senhores eram beneficiados, pois estes poderiam até mesmo libertar seus escravos, depois de algum tempo. Nós, como servos de Jesus Cristo, podemos dizer que temos o melhor senhor de todos! Ele não apenas é nosso Senhor, mas também é nosso irmão e se tornou servo, assim como nós precisamos ser. Jesus é o nosso maior exemplo de alguém que se torna um escravo, por amor a Deus e aos homens.

Pois, assim como Cristo recebeu uma recompensa eterna do Pai, também nós teremos nosso galardão eterno, prometido por Deus, por nossos bons préstimos para a obra de salvação.

Um escravo deve olhar para o seu senhor como fonte de obediência e também de recompensa. Deus é recompensador daqueles que o buscam e, portanto, nós devemos ter a certeza de que Ele há de nos recompensar pelas nossas obras e por nosso serviço aos santos.

Porque Deus não é injusto para se esquecer da vossa obra, e do trabalho do amor que para com o seu nome mostrastes, enquanto servistes aos santos; e ainda servis. (Hebreus 6:10)

Servir a Deus significa servir aos homens, em especial servir aos santos do Senhor. Jesus nos ensinou que até um copo de água, servido a algum discípulo, terá o seu galardão! (Mateus 10:42)

Pr. Wendell Costa

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